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2024-01-19

“Deixamos de estar expostos a fatores geopolíticos ou especulativos”


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Depois de praticamente duas décadas de trabalho no exterior, José Teixeira assumiu, na segunda metade de 2022, a Direção Geral da Riopele. Nesta primeira entrevista, apalpa o pulso ao setor, analisa os investimentos em curso e examina o ADN da Riopele.

Integra os quadros da Riopele há praticamente dois anos depois de mais de uma década de experiência de trabalho no exterior. De que forma o trabalho desenvolvido internacionalmente é uma mais-valia para o exercício destas funções na Riopele?

Foi um longo e muito enriquecedor período de expatriação. Um total de 17 anos, dos quais 13 consecutivos, antes do meu regresso a Portugal para ingressar na Riopele. Ante as especificidades de outros setores da indústria noutros países e continentes, alguns países com dimensão continental, cabe valorizar que o contato com outras culturas, visões diferentes do mundo e dos constantes desafios que as culturas e conjunturas apresentam, são hoje, analiso eu, a parte mais valiosa do meu percurso profissional de 25 anos. A “bagagem” adquirida nesses anos e destinos tão diferentes aceleram a preparação para os desafios profissionais e pessoais de quem se propõe sair do conforto e segurança do País, da língua, da família e dos amigos. Não se faz sem saudade, não se faz sem dor de alma, e só se faz quando o suporte familiar e as amizades são sólidos.

Do ponto de vista profissional, o que aprendeu nesse período?

Este vivenciar de culturas e setores, mais avançadas em alguns aspetos e, claro, menos noutros, ter vivido crises, oportunidades e desafios antecipadamente às ocorrências no nosso País ou no setor têxtil, dão-me hoje um amplo leque de soluções que conferem rapidez e assertividade às decisões, permitem-me ver, e passar aos meus colegas da Riopele, as situações com otimismo, sem drama e descortinando as oportunidades que cada desafio traz. Como dizem num dos países onde trabalhei, “se o mundo te der um limão, faz uma limonada”. E como resultado deste percurso a que se soma diariamente o carinho, paciência e ensinamentos dos colegas da Riopele, não individualmente, mas como equipa, estamos preparados para todos os desafios que se nos vão colocando.

A Riopele tem em curso um forte programa de investimento. Qual é a grande ambição?

De uma forma simples, é concretizar o nosso lema e os nossos pilares estratégicos, “preparar a empresa para mais cem anos” promover e cumprir os objetivos dos 3 pilares estratégicos: rentabilidade, sustentabilidade e pessoas. Partindo destes compromissos, os grandes investimentos em curso centram-se em, desde logo, em modernizar as instalações da Riopele e consequentemente a eficiência energética dos nossos edifícios e condições de trabalho; apostar num parque de máquinas sempre moderno e eficiente; investir em fontes energéticas, térmica e elétrica, renováveis, e produtos que resultam da circularidade dos têxteis-moda ou de reciclagem. Estamos empenhados em reduzir o consumo e aumentar a recuperação da água necessários aos nossos processos; reforçamos a aposta permanente na formação dos nossos Recursos Humanos, assim como a melhoria consistente das condições de trabalho em todas as suas vertentes.

Qual o investimento previsto?

No caminho até 2027, ano do centenário da Riopele, estaremos a executar um plano de investimento próximo dos 20M€.

Um dos objetivos anunciados passa por assegurar a neutralidade carbónica já em 2027. De que forma pensa ser possível atingir essa meta?

Como dizia o Poeta, “o caminho faz-se caminhando”. Começámos por aferir o nosso ponto de partida. Em 2022 calculámos a nossa pegada de 2021, nos 3 âmbitos definidos. Ato contínuo, definimos a meta para 2027 e o caminho, ou sejam, as ações que a ela nos levarão. Para o conseguirmos, e referindo-me aos âmbitos 1 e 2, temos de garantir a concretização de múltiplos aspetos, desde logo que atingimos os 100% de energia de fontes não fósseis, mas também a reciclagem dos nossos resíduos e a circularidade dos nossos produtos, apenas para referir alguns dos nossos compromissos. No âmbito 3, cadeia de valor externa à Riopele, o caminho será mais longo. Cabe-nos sensibilizar os nossos parceiros, otimizar os nossos fluxos, para que também o âmbito 3 convirja para a neutralidade. Uma boa fatia do investimento referido anteriormente é vocacionada, direta ou indiretamente, para a neutralidade carbónica. E nenhum outro investimento pode colocar em causa esse objetivo.

Qual a importância do investimento na central de biomassa para o futuro da Riopele?

Fundamental no futuro, diria mesmo já o é atualmente. Sendo o material combustível nacional, de fonte renovável como é a biomassa, trazemos estabilidade ao custo do vapor que utilizamos nos nossos processos, deixando de estar expostos a fatores geopolíticos ou especulativos. Tudo isto com neutralidade carbónica. Contribuímos com este projeto simultaneamente para os nossos três pilares estratégicos, asseguramos a rentabilidade, promovemos a sustentabilidade por neutralidade carbónica, contribuindo para o orgulho dos nossos colaboradores por fazerem parte da Riopele.

Não obstante o abrandamento económico internacional, a Riopele tem vindo a crescer e a consolidar a sua presença no mercado internacional. Quais são os principais fatores distintivos da empresa?

Claro que a excelência dos nossos produtos e a verticalidade do nosso processo são, per si, fatores de distinção. Contudo, na minha opinião, é no que menos se vê que se “esconde” a nossa grande vantagem. A Riopele define a sua estratégia, o seu crescimento, enfim, o seu futuro, muito ciente dos seus valores e das expetativas dos seus clientes. Não vamos atrás de notícias, de comentários circunstanciais, eufóricos ou trágicos, para definirmos o que iremos fazer. Se preferir, sabemos para onde queremos ir, dizemos o que faremos e, seguramente, faremos o que dissermos. Perseguimos, no sentido positivo da palavra, a satisfação plena dos nossos clientes, alimentamo-los constantemente com produtos inovadores, distintivos, sustentáveis, de qualidade, ou seja, de evidente valor. Procuramos incessantemente superar-nos, com novos clientes e novas geografias, ao bom estilo Lusitano, dando novos mundos aos nossos produtos, e garantindo que um cliente que chega à Riopele, nunca mais nos deixará, tornando-se um parceiro.

A Riopele foi distinguida, em dois anos consecutivos, como “a empresa têxtil mais atrativa para se trabalhar em Portugal”. Qual a importância de valorizações como esta para a afirmação da Riopele?

Essa distinção é importante para a Riopele porque evidencia que, e isso nem sempre ocorre, as condições que proporcionamos aos nossos colaboradores são as que contam. São as que contribuem verdadeiramente para o bem-estar no trabalho, a evolução social de cada um de nós e a formação e atualização de conhecimento em contínuo. Na Riopele colocamos as pessoas como um dos três pilares que asseguram a nossa visão e cumprem os nossos valores, representando o presente e o futuro de uma história com quase 100 anos. Em todos os indicadores de recursos humanos estamos a melhorar dia-a-dia. Sabemos que pessoas motivadas e capacitadas superam resultados, na empresa e nas suas vidas particulares.

Tem muita experiência noutros setores de atividade, nomeadamente na indústria automóvel. É atualmente Diretor-Geral de uma das empresas têxteis de referência na Europa. Com base na sua experiência, de que forma deve evoluir a indústria têxtil e de vestuário em Portugal para assegurar novos ganhos competitivos no futuro?

Uma vez que a questão é mais ampla, não se cingindo à Riopele, na indústria têxtil e vestuário vejo como fundamentais os seguintes pontos: a estratégia constrói-se conhecendo o produto e as capacidades da empresa, os desejos dos clientes, e os objetivos a alcançar. A estratégia não se altera para conseguir algo que não sejam os objetivos definidos, de médio ou longo prazo e nunca se altera por razões oportunistas e esporádicas (repare que disse oportunistas e não por oportunidades). Também na indústria têxtil e vestuário defendo que se insista mais e mais no valor dos nossos produtos e serviços, deixando o discurso, que fatalmente nos levará a perder negócio, da competitividade pelo preço. Repito algumas vezes, e volto a referir, os clientes que orientam as suas decisões apenas pelo preço não são os que ficarão. Quem vem por preço, por preço partirá, quem vier pelo valor, ficará como nosso parceiro. Não é menos importante a aposta na digitalização e monitorização por indicadores que trazem rapidez e assertividade à decisão e partilha com todos os níveis da organização dos objetivos e seu cumprimento, o que confere uma dinâmica de equipa focada no resultado. O aproveitamento dos desenvolvimentos em inteligência artificial e modelos preditivos que antecipam problemas e indicam soluções. A automatização de fases dos processos em que o cérebro humano não esteja a acrescentar valor. E por fim, nestes e em todos os processos da empresa, promover a melhoria contínua.